domingo, 17 de fevereiro de 2008

Jacmel


Não são poucas as razões que tenho para gostar de Jacmel. Para muitos é de longe a melhor cidade do Haiti. Omar Thomaz me diz que prefere Cap Haïtien, que de fato deve ter seus encantos, sobretudo pela história e pelo passado da cidade. Mas Jacmel sem dúvida est três charmant.



As razões pela escolha da cidade como meu campo de pesquisa têm menos a ver com tais coisas e muito mais com as indicações de meu co-orientador Laeneck Hurbon. Natural desta cidade foi nela que desenvolveu a maior parte de suas pesquisas. Muitos apontariam o Plateau Central como uma região excelente para a minha pesquisa, outros a região de Gonaives. O vale do Rio L’Artibonite, especialmente Mirebelais, onde Herskovits fez suas pesquisas nos anos 30, e Ville de Bonheur, lugar da peregrinação anual ao Saute D’Eau, onde se cultuam os loas Danbalah Wedo (a serpente) e sua esposa Aida Wedo (o arco-íris), e ainda Ezili, também conhecida como Maitresse La Sirene ou Maitresse Dlo, rainha das águas doces. Poderia também falar de Leogane ou da própria Port au Prince, que esconde em seus bairros pobres dezenas de oufós e que foi o centro das pesquisas de Alfred Métraux. Há inúmeras cidades, algumas delas que pretendo percorrer durante este ano de pesquisas aqui, todas elas poderiam ser escolhidas como base principal de meu trabalho.


Mas independente de qualquer coisa, Jacmel é sim apaixonante. A cidade tem nela ainda um pouco do que resta das construções mais antigas, do começo do século, as gingerbread houses, casas em estilo antigo, combinando em sua construção detalhes em madeira e metal com a base em alvenaria. Há também aquele charme decadente, que meu amigo João Marcelo atribui bem à nossa bela São Sebastião do Rio de Janeiro, e que faz de Jacmel algo mais sedutor. Pesam ainda as questões de segurança. Longe da confusão caótica e dos blokis na circulação entre Delmas, Carrefour, Pétion Ville e o coração da capital, o centro de Port au Prince, Jacmel é uma tranqüilidade. Não há sinais da (suposta ou real) violência da capital, o que não torna, porém, a cidade menos pobre. Sim, a pobreza crônica daqui também se apresenta com sua face mais cruel, refletindo a distância absurda entre o mundo rural do Haiti e o mundo urbano, que se misturam de uma forma, muitas vezes indecifrável.



Mas Jacmel é uma saborosa cidade, com ar provinciano e, contraditoriamente e ao mesmo tempo, ares de capital cultural. O carnaval daqui é famoso, e foi contado em romance da escritora Edwige Danicat. As máscaras de papel marché e os grupos rara (lê-se rár-ra) com sua percussão e sopros, seu festival anual de cinema, com seus grupos de dança e teatro, Jacmel respira uma vida cultural ainda por ser descortinada.


Em Jacmel também foi o lugar onde encontrei Aveman Valsaint, um ougan do vodu, Rourource, meu “Muchona”, Rennete, uma bela e simpática dona de bar, Bobu, que me alugou a casa da primeira vez que vim aqui... Um monte de gente daqui que ainda contarei muitas histórias.

Em Jacmel é possível ter a clara noção de que estamos no Caribe: o mar, o verde, os coqueiros, a comida: Poisson à Buccaneer, peixe temperado com pimenta e outras iguarias, assado na brasa. A lembrança do tempo dos piratas... Enfim, isto é Jacmel.




* * * *


Mas por essas razões e por muitas outras, entre elas o grande interesse turístico que a cidade desperta, Jacmel é um lugar caro para morar. Difícil para um estudante com bolsa de doutorado procurar uma casa por aqui. E isso tem sido uma verdadeira cruz, pesada de carregar: encontrar o lugar definitivo de me instalar. Sinto-me mal de permanecer ainda em Port au Prince, na casa de Laeneck, sentindo que lhe incomodo, porém, muito gentilmente ele tem me ajudado a achar a melhor opção.




Hoje conversando com algumas pessoas, disseram que uma das casas que me ofereceram, pelo valor que posso pagar, é mais do que excelente. Em que pese os problemas que achei na casa: pouca luminosidade e uma distância grande do centro da vila de Jacmel. Aliás, um dos problemas das casas é exatamente a forma em que são construídas. São estranhas, pois têm pouca circulação de ar e luminosidade, apesar de até ter bom espaço. Parecem meio amontoadas, não sei descrever de modo preciso, mas têm espaços que são meio disformes. A cozinha, por exemplo, parece um ninho. Os quartos, ou são grandes demais ou, embora compridos, são estreitos. E ainda, A sala é comprida demais e estreita. Sei lá... Não quero ser exigente demais, pelo contrário...


O que eu queria de fato é um pequeno apartamento, com eletricidade e água corrente, um fogão, muita luminosidade e bem arejado. Nem faço questão de uma geladeira, uma artigo de luxo num país onde a corrente elétrica é intermitente. Se tiver, melhor ainda. Um isopor com gelo resolve o caso, conservar poucas coisas, pois aqui, por conta da falta de energia, somos obrigados a fazer compras diariamente, para evitar que carnes, frutas e legumes se estraguem. E o mais importante, mais próximo do centro da vila. Isso é o bastante.


Vi outras casas, onde tudo parecia ainda por fazer, tudo muito desarrumado e abafado, calorento e ruim. Como disse e insisto, não sou exigente. Quero um mínimo que possibilite desenvolver meu trabalho. Se puder conseguir isso, me basta.




Abraços a todos








P.S.: Feliz da vida com o Mengão!!!!!!!!!!!!!!!!

Um comentário:

João Marcelo Maia disse...

Zé, e o melhor foi o pênalti perdido pelo Edmundo. Não tem preço.